quarta-feira, 23 de outubro de 2013

CONVERSANDO COM

LUÍS BRAVO
 
 
 
1 -  Boas Luís... és um dos bons produtores de música eletrónica de dança que temos nos Açores, conta-nos um pouco como começou esta tua aventura?
Boas Miguel, desde já agradeço o convite, é um prazer. Bem, tudo isto começou por volta de 2004, 2005, o gosto pela música de dança para ser mais preciso. Cresci a ouvi rock, desde o punk ao heavy metal. As primeiras saídas á noite, entrar nas discotecas, a curiosidade daquele mundo novo. Mas acho que a viragem propriamente dita, foi nas Sanjoaninas de 2005 (salvo erro), no Porto das Pipas, fui ver e ouvir Pete tha Zouk, e de facto gostei do ambiente, a envolvência das pessoas, pois até ali, eletrónica não era música para mim. Um dos temas tocados foi a "Solid Textures", bem, a forma como fez click na minha cabeça foi incrível  (risos). Mal sabia eu do que estava para vir. No entanto fui-me interessando, comecei a dar uns toques de teclado numas brincadeiras de banda, e a trabalhar com os softwares. E pensei, “porque não fazer algo?", o material que eu possuía era do mais básico, mas mesmo assim tentei. Algumas dicas e força de um grande amigo, e o primeiro produtor para mim, João Barcelos (Jay Barcelos como artista), fui ganhando o gosto e com calma e sempre de pé atrás fui tentando aprender. Em 2008 editei uma remistura, que foi o pontapé de saída, básico e inexperiente, mas o qual agradeço, porque no geral, tudo faz parte da evolução. E hoje em dia ouço de tudo um pouco, e agradeço isso à eletrónica, abriu os meus horizontes.
 
2 - Já editas-te por labes de renome como a Aenaria do famoso Dj italiano Luca Ricci, embora o teu nome não seja muito conhecido e falado nos Açores, a que achas que se deve esse fato?
Acho que é aquele estereótipo comum, “o que vem de fora é que é bom”. Talvez seja um pouco isso, também não produzo algo para as massas, uma minoria gosta, e resume-se a eles. As rádios não respondem aos mails, por isso acabamos também por "desistir" de certa forma. A insularidade não ajuda, o género também não, mas um pouco de orgulho pelos nossos artistas, sejam estes músicos ou não, faz falta. E nem falo de mim obviamente, mas de quem anda cá à anos e muitas vezes não tem o respeito e projeção merecidos.
3 - Qual o software e hardware que usas e qual o género que mais gostas de produzir?
Trabalho com o Reason, utilizo muitas versões devido a projetos e colaborações, mas neste momento é o velhinho 4. Adoro aqueles fios (risos). No entanto o Live está na mira, e entrará para as minhas ferramentas sem dúvida. Hardware não tenho muito por enquanto, investi num bom PC estúdio, tenho um midi básico da M-Audio, e os meus monitores Adam A5X. Embora no último ano tenha andado dentro da variante mais deep/tech/house, não sigo nenhum estilo em concreto. Claro que o que ouvimos influencia sempre, e não acredito em quem diz "não ouço nada”. Porque já foi feito de tudo, agora cabe a cada um fazer o mais original ou pessoal possível. Mas o género base é o house, mas tenho muita coisa para sair e em fase de construção que até tem Drum & Bass. Por isso às vezes é deixar fluir, e o estado de espirito e a inspiração tratam do resto! (risos)
 
4 - Quantos temas já produziste e remisturas te, qual o que te toca mais?
Se não me falha a memoria,16 originais (3 deles como Sleep N More) e 6 remisturas editadas ate à data. Acho que ainda não fiz, nem sei se vou fazer, a tal faixa da qual me orgulho muito. Mas tenho algumas que tem um sabor especial, porque foram produzidas em alturas difíceis, acaba por ficar um pouco nós nas mesmas. Há temas que me arrependo de ter editado pela falta de técnica entre outras, mas como já referi anteriormente, faz parte da evolução. A que me deu mais alegrias e teve maior sucesso a nível de vendas foi a "Yang", foi um risco na altura porque foi algo que saiu do nada, e acabou por ser compilada várias vezes, e um ano depois ainda rola em sets, o que é gratificante. Mas todas tem o seu lugar especial sem dúvida!
 
5 - Como artista produtor de música eletrónica deves receber algo pelo teu trabalho, de onde vem o teu incoming, de royaltis, quem te paga, recebes também da SPA, podes falar um pouco sobre este assunto?
Este é um assunto delicado (risos). Até à data não recebi nada pelas faixas, algumas não venderam o suficiente, e a falta de comunicação com editoras etc. Ainda estou verde nesta área, porque sou o tipo de pessoa que faz sem ter nada em troca, mas claro que há que ter os pés bem assentes. Neste último ano até à data as vendas têm aumentado consideravelmente e futuramente surgirão os ditos "lucros”. Existem datas para os pagamentos, e caso estes não tenham uma quantia mínima, passam para a próxima entrega de lucros, e assim sucessivamente, até atingir o montante mínimo para uma transferência.
Em alguns casos são as editoras que pagam, noutros as distribuidoras (que é a empresa que está por detrás da editora),e as quantias variam com o tipo de contrato, se é um álbum, EP ou remistura. Como vês o que envolve dinheiro é confuso (risos). Prefiro ficar mesmo só pela música!
 
6 - O que achas que falta nos Açores para que os Artistas cá da Região possam quebrar a barreira da insularidade?
Faltam os ditos apoios culturais, o querer saber e dar a conhecer. Muitas das vezes quem está à frente dos meios de divulgação, quer seja rádio, tv, etc., vai pelos seus gostos pessoais, e acaba por abafar grandes talentos que infelizmente passam despercebidos. Uma filtragem precisa e com a devida atenção ao que se faz por cá podia dar grandes resultados a muitos artistas. A Meca para o açoriano é ser conhecido "lá fora”, mas o apoio tem de partir de cá.
 
7 - Em relação à noite dançante da Terceira, qual a tua opinião?
Esta é das tais perguntas na qual podia escrever sem parar (risos). A noite mudou muito, sem dúvida. Para mim para a negativa. “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”, à letra. Cheguei a sair só para ouvir os dj’s da velha guarda, ia à Twins Club ouvir Ricky, The One, os Brothers on Dish, Oliver T, Gastão R, entre outros, que a meu ver foram muito importantes na underground scene local e pelos quais tenho um respeito enorme. Mas os facilitismos vieram tirar um pouco de cena quem tocava mesmo por gosto, tanto que existem dj’s hoje em dia demais, atrevo-me a dizer. Porque sejam dj’s de Tracktor ou de vinyl, se forem bons, o mérito está lá. Mas muitas das casas preferem ir pelo fácil, e não os devemos julgar por isso, tempos de crise, o que lucra é o que vai para venda, simples. Mas se a educação musical não surgir nem com os djs, nem com as casas, a noite será cada vez mais banalizada. Acho que há espaço para todos, desde o comercial, até ao extremo underground. Agora a quem cabe equilibrar esta balança? Fica a pergunta no ar.

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